A PANDEMIA DO VÍRUS COVID-19 E A MEDIDA PROVISÓRIA Nº 931/2020

É fato a ocorrência de calamidade pública mundial, representada pelo avanço do vírus COVID-19, classificado pelo Governo Federal brasileiro como pandemia através da Lei n.º 13.979/20, que prevê medidas para enfrentamento de emergência de saúde pública de importância internacional.

Posteriormente à mencionada Lei Federal, houve uma série de medidas adotadas nos âmbitos Estadual e Municipal, visando restringir a aglomeração de pessoas e, como consequência, a possibilidade de disseminação do vírus COVID-19, como, por exemplo, o fechamento dos estabelecimentos comerciais não essenciais e a restrição de mobilidade e deslocamento das pessoas.

Atenta ao momento restritivo mundialmente atravessado e ciente de que a rotina legalmente imposta ao ambiente societário leva, naturalmente, ao aumento da aglomeração e circulação de pessoas (em especial entre os meses de janeiro e abril, nos quais ocorrem a grande maioria das assembleias e reuniões nas sociedades e cooperativas), a Medida Provisória nº 931/2020 visa, basicamente, adequar a rotina empresarial ao momento excepcional vivido.

Neste sentido, em relação às Sociedades Anônimas, o artigo 1º da Medida Provisória nº 931/2020 alterou o regramento do artigo 132 da Lei n.º 6.404/76, para permitir que aquelas Companhias cujo exercício social se encerre entre as datas de 31/12/2019 e 31/03/2020 possam realizar a anual e obrigatória Assembleia Geral Ordinária no prazo de 07 (sete) meses, contado do término do seu exercício social.

Tal medida, na prática, autoriza excepcionalmente a realização da Assembleia Geral Ordinária até o limite do mês de outubro do presente ano, dependendo da data de encerramento do exercício social da Companhia.

Para viabilizar tal determinação foram incluídos três parágrafos ao referido artigo 1º da Medida Provisória nº 931/2020 que, respectivamente: (i) torna expressamente sem efeito toda e qualquer disposição contratual que exija a realização da Assembleia Geral Ordinária em prazo inferior ao referido no caput; (ii) prorroga a vigência do mandato dos administradores e fiscais das Companhias até a realização da Assembleia Geral Ordinária ou até que ocorra a reunião do conselho de administração (caso esta seja a hipótese aplicável à Companhia); e (iii) possibilita ao Conselho de Administração (ressalvada a hipótese de previsão diversa no estatuto social) deliberar, ad referendum, assuntos urgentes de competência da Assembleia Geral.

Os mencionados dispositivos evitam possíveis disputas ao afastar de forma clara a aplicação de disposições estatutárias ou constantes de acordos de acionistas que eventualmente exijam a realização da referida Assembleia durante o período de suspensão (entre 31/12/2019 e 31/03/2020).

Evitam, ainda, ao prorrogar os mandatos dos administradores e fiscais, que a Companhia fique acéfala no interregno de prazo entre o qual deveria naturalmente ocorrer a Assembleia Geral Ordinária (e, eventualmente, a nomeação de novos administradores e fiscais) e a sua efetiva realização em até 07 (sete) meses a posteriori, autorizando que os fiscais e administradores continuem em atuação, com seus mandatos efetivos, até a realização da Assemblei Geral Ordinária. Há autorização, inclusive, para que esses administradores adotem, enquanto órgão (Conselho de Administração), eventuais medidas urgentes a serem posteriormente referendadas pela Assembleia Geral.

Ainda em relação às Sociedades Anônimas, o artigo 2º da Medida Provisória nº 931/2020 possibilita ao Conselho de Administração (se houver), ou à diretoria, declarar dividendos na forma do artigo 204 da Lei n.º 6.404/76, independentemente de reforma do Estatuto Social, sendo que o respectivo artigo 3º concede à Comissão de Valores Mobiliários a discricionariedade de prorrogar os prazos específicos estabelecidos na Lei n.º 6.404/76 para cumprimento das obrigações impostas às Companhias de capital aberto.

Na linha do quanto posto às Sociedades Anônimas, no que se refere às sociedades de Responsabilidade Limitada e às Cooperativas (e entidades de representação do cooperativismo), os artigos 4º e 5º da Medida Provisória nº 931/2020 também possibilitam que os referidos tipos societários, naquelas estruturas cujo exercício social se encerre entre as datas de 31/12/2019 e 31/03/2020, possam realizar sua anual e obrigatória Assembleia no prazo de 07 (sete) meses, contado do término do seu exercício social.

No âmbito das Cooperativas (e entidades de representação do cooperativismo) a Medida Provisória nº 931/2020 postergou a vigência do mandato dos administradores e fiscais nomeados até a efetiva realização da Assembleia Geral (artigo 5º, parágrafo único).

No que tange às sociedades de Responsabilidade Limitada, além da postergação do referido mandato até a realização da Assembleia (artigo 4º, §2º), a Medida Provisória nº 931/2020 afastou expressamente a aplicação de disposições contratuais ou constantes de acordos de quotistas que eventualmente exijam a realização da referida Assembleia durante o período de suspensão (entre as datas de 31/12/2019 e 31/03/2020), em similitude ao quanto realizado no âmbito das Sociedades Anônimas.

É pertinente o registro, neste ponto, que especificamente os sócios das sociedades de Responsabilidade Limitada têm a possibilidade de deliberar por escrito as matérias que seriam tratadas em Assembleia, dispensando a realização do conclave nos termos do artigo 1.072, §3º do Código Civil .

Assim, não obstante a autorização concedida pela Medida Provisória nº 931/2020 para prorrogação do prazo legal para realização da Assembleia de sócios, caso haja viabilidade e disposição de todos os sócios, o voto por escrito pode ser alternativa para se prosseguir com deliberações societárias regulares, mesmo diante da prorrogação concedida.

Diante da situação imprevisível imposta pela pandemia do vírus COVID-19 (inclusive em relação ao prazo de 07 – sete – meses inicialmente previsto), visando viabilizar a prática regular dos atos societários e se adequar ao momento mundialmente atravessado, a Medida Provisória nº 931/2020 determinou, em seus artigos 7º , 8º , 9º e 10º , respectivas alterações nos regramentos legais atinentes às sociedades de Responsabilidade Limitada, Cooperativas (e entidades de representação do cooperativismo) e Sociedades Anônimas, de modo a permitir que o sócio, associado, ou acionista possa participar e votar a distância em reunião ou assembleia, conforme regulamentação da Comissão de Valores Mobiliários e do DREI – Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia.

Essas alterações em curso, visando permitir que o sócio, associado, ou acionista possa participar e votar a distância em reunião ou assembleia, vão de encontro com o atual momento de pandemia atravessado e com o reconhecido estado de interface globalizada entre investidores e estruturas societárias, sendo que os mecanismos a serem criados e aplicados devem figurar como facilitadores do exercício do direito pelas partes e como desburocratizadores da estrutura societária, mas nunca como elemento apto a suprimir o direito dos sócios, acionistas ou associados, em especial aqueles minoritários que não fazem parte da gestão da sociedade.

Gabriel Ribeiro Semião

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“Art. 1º A sociedade anônima cujo exercício social se encerre entre 31 de dezembro de 2019 e 31 de março de 2020 poderá, excepcionalmente, realizar a assembleia geral ordinária a que se refere o art. 132 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, no prazo de sete meses, contado do término do seu exercício social.
§ 1º Disposições contratuais que exijam a realização da assembleia geral ordinária em prazo inferior ao estabelecido no caput serão consideradas sem efeito no exercício de 2020.
§ 2º Os prazos de gestão ou de atuação dos administradores, dos membros do conselho fiscal e de comitês estatutários ficam prorrogados até a realização da assembleia geral ordinária nos termos do disposto no caput ou até que ocorra a reunião do conselho de administração, conforme o caso.
§ 3º Ressalvada a hipótese de previsão diversa no estatuto social, caberá ao conselho de administração deliberar, ad referendum, assuntos urgentes de competência da assembleia geral.
§ 4º Aplicam-se as disposições deste artigo às empresas públicas, às sociedades de economia mista e às subsidiárias das referidas empresas e sociedades.
Art. 2º Até que a assembleia geral ordinária a que se refere o art. 1º seja realizada, o conselho de administração, se houver, ou a diretoria poderá, independentemente de reforma do estatuto social, declarar dividendos, nos termos do disposto no art. 204 da Lei nº 6.404, de 1976.
Art. 3º Excepcionalmente durante o exercício de 2020, a Comissão de Valores Mobiliários poderá prorrogar os prazos estabelecidos na Lei nº 6.404, de 1976, para companhias abertas.
Parágrafo único. Competirá à Comissão de Valores Mobiliários definir a data de apresentação das demonstrações financeiras das companhias abertas.”

“Art. 4º A sociedade limitada cujo exercício social se encerre entre 31 de dezembro de 2019 e 31 de março de 2020 poderá, excepcionalmente, realizar a assembleia de sócios a que se refere o art. 1.078 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil no prazo de sete meses, contado do término do seu exercício social.
§ 1º Disposições contratuais que exijam a realização da assembleia de sócios em prazo inferior ao estabelecido no caput serão consideradas sem efeito no exercício de 2020.
§ 2º Os mandatos dos administradores e dos membros do conselho fiscal previstos para se encerrarem antes da realização da assembleia de sócios nos termos previstos no caput ficam prorrogados até a sua realização.”
“Art. 5º A sociedade cooperativa e a entidade de representação do cooperativismo poderão, excepcionalmente, realizar a assembleia geral ordinária a que se refere o art. 44 da Lei nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971, ou o art. 17 da Lei Complementar nº 130, de 17 de abril de 2009, no prazo de sete meses, contado do término do seu exercício social.
Parágrafo único. Os mandatos dos membros dos órgãos de administração e fiscalização e dos outros órgãos estatutários previstos para se encerrarem antes da realização da assembleia geral ordinária nos termos previstos no caput ficam prorrogados até a sua realização.”
Para sociedades de Responsabilidade Limitada, previstas no artigo 1.078 do Código Civil e, para as Cooperativas, prevista no artigo 44 da Lei nº 5.764/1971 ou no artigo 17 da Lei Complementar nº 130/2009. “Art. 1.072. As deliberações dos sócios, obedecido o disposto no art. 1.010 , serão tomadas em reunião ou em assembléia, conforme previsto no contrato social, devendo ser convocadas pelos administradores nos casos previstos em lei ou no contrato. § 1 o A deliberação em assembléia será obrigatória se o número dos sócios for superior a dez. § 2 o Dispensam-se as formalidades de convocação previstas no § 3 o do art. 1.152 , quando todos os sócios comparecerem ou se declararem, por escrito, cientes do local, data, hora e ordem do dia. § 3 o A reunião ou a assembléia tornam-se dispensáveis quando todos os sócios decidirem, por escrito, sobre a matéria que seria objeto delas. § 4 o No caso do inciso VIII do artigo antecedente, os administradores, se houver urgência e com autorização de titulares de mais da metade do capital social, podem requerer concordata preventiva.
§ 5 o As deliberações tomadas de conformidade com a lei e o contrato vinculam todos os sócios, ainda que ausentes ou dissidentes. § 6 o Aplica-se às reuniões dos sócios, nos casos omissos no contrato, o disposto na presente Seção sobre a assembléia.”

“Art. 7º A Lei nº 10.406, de 2002 – Código Civil, passa a vigorar com as seguintes alterações: ‘Art. 1.080-A. O sócio poderá participar e votar a distância em reunião ou assembleia, nos termos do disposto na regulamentação do Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia.’” (NR)
“Art. 8º A Lei nº 5.764, de 1971, passa a vigorar com as seguintes alterações: ‘Art. 43-A. O associado poderá participar e votar a distância em reunião ou assembleia, nos termos do disposto na regulamentação do Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia.’” (NR)
“Art. 9º A Lei nº 6.404, de 1976, passa a vigorar com as seguintes alterações: ‘Art.121 ……………………………………………………………………………………………… § 1º Nas companhias abertas, o acionista poderá participar e votar a distância em assembleia geral, nos termos do disposto na regulamentação da Comissão de Valores Mobiliários.
§ 2º Nas companhias fechadas, o acionista poderá participar e votar a distância em assembleia geral, nos termos do disposto na regulamentação do Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia. (NR) Art.124. …………………………………………………………………………………………. ……………………………………………………………………………………………………………….. § 2º A assembleia geral deverá ser realizada, preferencialmente, no edifício onde a companhia tiver sede ou, por motivo de força maior, em outro lugar, desde que seja no mesmo Município da sede e indicado com clareza nos anúncios.
§ 2º-A Regulamentação da Comissão de Valores Mobiliários poderá excepcionar a regra disposta no § 2º para as sociedades anônimas de capital aberto e, inclusive, autorizar a realização de assembleia digital. ……………………………………………………………………………………………………………..’” (NR)
“Art. 10. Fica revogado o parágrafo único do art. 121 da Lei nº 6.404, de 1976.”

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